13 de junho de 2017

Por Que Não Faço Nenhum Procedimento Estético

Quando comecei na Medicina, em 1992 e, em seguida, na Dermatologia, em 1993, logicamente, por entusiasmo e por mais facilidade em ganhar dinheiro, comecei trabalhando com estética.

Era uma clínica de excelente padrão; não havia laser, não havia toxina botulínica, nem procedimentos invasivos. Na verdade, esta "estética" era uma cosmiatria muito ética adicionada de alguns peelings superficiais, e de um certo auxílio de umas esteticistas, também éticas e sérias. Era um bom ambiente.
Os pacientes vinham com suas rugas, flacidez, celulite, gorduras localizadas ou peles simplesmente feias, e os médicos proporcionavam a essas pessoas um tratamento coerente com o limite da estética e com o grau de esperança do cliente.

Curiosamente, as pessoas reconheciam os limites que estes tratamentos proporcionavam. E o relacionamento era bom, duradouro e linear.

Mas isto mudou. Chegaram os lasers, os aparelhos de todo tipo, uma quantidade de procedimentos e de peelings mirabolantes, a propaganda maciça em meios de comunicação limítrofes, e veio a internet com o absurdo da informação inútil, a massificação da tecnologia, a indústria farmacêutica / cosmética internacional com centenas e centenas de produtos que, em sua maioria, não servem para absolutamente NADA.

Há exceções.

Com isto tudo brotou em mim uma semente de frustração, de confrontar a ciência com toda esta parafernália “promissora” e com a aflição das pessoas em voltar no tempo, muitas vezes fugindo das reais questões da vida, pessoais e profissionais.

Mas o tempo não dá marcha a ré. As pessoas raramente mudam seus estilos de vida.

E brotou intolerância, impaciência, crises internacionais, polarizações políticas, e o desemprego. Enfim, as pessoas mudaram muito. Tornaram-se exigentes de resultados impossíveis. Deixaram de aceitar a feiura e o envelhecimento. Elevaram ao status de “inaceitável” e de doença mudanças absolutamente normais que acontecem ao longo da vida. E viraram consumidoras famintas de cirurgias arriscadas, procedimentos duvidosos, passando inclusive a ingerir substancias perigosas para a saúde.

A coragem da vaidade realmente sempre me assustou e surpreendeu...

E, por mais que se tente imprimir coerência, por mais que se esclareça, vence a fantasia. Vence o sonho. Vence a expectativa irreal de perfeição, juventude e beleza. Ninguém aceita mais ser feio, ser velho, ter rugas, ter manchas. Não há nada de surpreendente nisto: entre o sonho e a realidade, o sonho sempre vencerá. A crença sempre ganhará do óbvio. É nossa natureza !

Mas...

É muito doloroso lidar com pessoas que chegam à meia idade ou estão muito além dela, e ver que simplesmente o diálogo é impossível. Que nenhuma informação científica e técnica é aceita. Que ainda acreditam que o tempo voltará atrás. E não se consegue trazer as pessoas ao terreno da razoabilidade.

Há exceções...

Muito doído, infeliz, lidar com pessoas que se submetem a peeling e acham que não é suficiente ou ficou pior, que querem uma aplicação toxina botulínica seguida de diversas reaplicações (“retoques”, como chamam) porque nunca ficam satisfeitas, ou fazem preenchimentos seguidos achando que o a ruga não ficou preenchida ou o volume do rosto não é ainda suficiente.

Pior ainda.... Encontrar pessoas que querem procedimentos e, em seguida, decidem que o culpado por serem velhas, feias, ou ambos, é justamente o profissional que tentou ajudá-las. Acreditem, isto acontece com frequência. E magoa demais aquele que se arrisca profissionalmente para tentar “ajudar”.

Então, quem quiser estética, procedimentos injetáveis, procure por favor clinicas especializadas nisto. Procure cirurgiões plásticos, e eu posso indicar vários excelentes. Quem tiver bom-senso de verdade, que procure psicanálise simultaneamente.

Quem estiver realmente doente da pele, ou com acne, ou queira de mim uma cosmiatria séria e muito bem fundamentada, estou de portas abertas. Mas procedimentos que signifiquem riscos para ambos... não.


Porque ainda que a ciência nos prognostique um tempo de vida longuíssimo, não devolverá aos nossos cérebros a autoestima que achávamos que tínhamos. Autoestima é uma construção permanente que tem que começar desde muito cedo, desde muito criança, para que, na velhice, ou na feiura, ou na concomitância dos dois, saibamos onde realmente ainda somos lindos, jovens e ÚTEIS. Autoestima não envelhece. A beleza e a juventude apenas trasladam entre o corpo e a consciência individual. E o conceito de vitalidade, de utilidade, a mim ao menos parece que deve substituir qualquer frustração advinda da obviedade de envelhecer e tornar-se menos atraente ao espelho e à sexualidade alheia.